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Uma introdução ao Yoga

 

 

O yoga é uma filosofia dedicada à compreensão da mente e à harmonização de seu mecanismo de funcionamento. Quando a mente encontra-se pura e emancipada de condicionamentos ela é capaz de expressar nossa verdadeira natureza espiritual. A plenitude e o discernimento decorrente deste processo nos possibilita compreender nossa meta existencial e conseguir seguir nosso caminho de forma respeitosa e harmônica. 

 

No entanto, enquanto isso não acontece, permanecemos reféns de uma mente viciada em seus condicionamentos e corrompida por suas próprias tendências argilosas. Dessa forma, a vida passa a ser dedicada à incessante busca por prazeres sensoriais e egóicos, e à constante repetição de padrões erráticos, incompatíveis com a nossa verdadeira essência, o que impossibilita a paz necessária para o processo de autodescobrimento.

 

Segundo o Yoga, apesar de tudo que esteja acontecendo em nossa vida, e independente da realidade que nos cerca, a mente pode permanecer livre de conflitos e agitações. Essa conquista depende do nível e da qualidade de funcionamento de nossa mente. Alcançar a maturidade de discernimento que permite uma franca e livre compreensão da realidade, e de si, e criar imunidade contra tudo que possa conduzi-la a níveis precários de compreensão e funcionamento é a proposta desta filosofia. 

 

Para o Yoga, a paz interior é uma meta possível. Ela pode se tornar sustentável após a compreensão de seus princípios filosóficos e, pincipalmente, através de sua aplicação em todos os aspectos e relações da vida. A paz, ou o sentimento de estar livre de conflito, não significa ausência de desafios e obstáculos na vida. Estar em paz é estar apto a vivenciá-los sem perder a clareza sobre a verdadeira natureza dos fatos nem se confundir sobre o próprio papel nas devidas circunstâncias que enfrentamos. A paz nasce da liberdade de conseguirmos ser nós mesmos, do cumprimento adequado de nossas ações e da realização dos deveres e papéis que cabem a nós realizar. 

 

O praticante de Yoga dedica-se a compreender sua proposta e aplicá-la em sua vida para alcançar este estado de paz, plenitude e liberdade. Para isso, inúmeras práticas são utilizadas. Mas não menos importante estão algumas ferramentas que já se encontram em nossas vidas. Entre elas a observação e a averiguação da qualidade das próprias ações e tarefas diárias, a conscientização e reavaliação de hábitos e tendências inconscientes que vivem em nós, ajudar a nos aproximarmos de nosso íntimo e tornar essa conexão duradoura. 

 

Essa proposta costuma gerar no indivíduo uma nova visão sobre a vida, a maneira com que passamos a interpretar o mundo e nosso papel nele. Estar aberto a essa transformação é algo desafiador. Isso requer uma grande capacidade de auto-entrega e uma boa instrução. Mexer com o inconsciente é algo trabalhoso. 

 

Por esses motivos, o Yoga pode ser considerado um caminho dinâmico e que incentiva a experimentação e o cumprimento da ação adequada. Ideologias apenas, provavelmente, não são capazes de possibilitar as transformações que realmente necessitamos. No Yoga a transformação do indivíduo não se dá através de rituais nem cerimônias específicas. Também não acontece pelo acúmulo de conhecimento ou pela obra do destino apenas. O resultado da conscientização dos ritos e atividades cotidianas, que passam a ser interpretadas como oportunidades para se trabalhar a autoanálise e o autocontrole da mente e suas reações, e práticas específicas, cabíveis à realidade de cada indivíduo e capazes de purificar e elevar o nível e a qualidade da mente, conduzem o indivíduo a inúmeras transformações. Essas transformações não são imediatas. Questões fundamentais, como a capacidade de codificar o conhecimento filosófico, e didático, em sabedoria, e desenvolver a força individual de auto entrega e aceitação perante os fatos e a realidade não surgem de um dia para o outro. O praticante experiente percebe que ela se dá através de uma certa ordem gradual que parece respeitar o tempo natural das coisas madurarem espontaneamente. O êxito costuma variar de acordo com a qualidade e intensidade com que se busca, assim como a natureza do sujeito e de seu momento interno. As transformações também dependem da conjuntura favorável do ambiente externo, e da eventual intervenção sadia de um professor experiente. 

 

Os professores de Yoga são praticantes que compartilham o que vêm aprendendo e transmitem o conhecimento que lhes foi passado por seus próprios professores. Essa tradição vem transmitindo a essência desta filosofia a milênios, sem a interferência de instituições ou distrações como certificações e métodos. Ela é fundamentada através da relação sincera entre professor e aluno. Trata-se de uma interação muito íntima entre os dois envolvidos, que explora uma jornada pessoal e individualizada, transmitida diretamente do coração do professor para o coração de seu aluno. 

 

Essa tradição não é voltada apenas à transmissão de técnicas nem na qualificação do aluno nessas mesmas técinicas. Trata-se de uma comunhão entre duas pessoas embasada na fé por este conhecimento, e na tentativa de fazer com que este seja sentido pelo aprendiz. O conhecimento vivenciado pelo aluno é novamente repassado para aqueles que nele buscarem este tesouro, e assim, a essência desta filosofia sobrevive para futuras gerações. 

 

Isso pode dar a falsa impressão de que o Yoga é uma filosofia cabível apenas para alguns indivíduos. Sua proposta não se limita a renunciantes ou praticantes de uma determinada seita ou credo, que renunciam os deveres sociais ou a vida moderna, para se dedicarem a este caminho. O Yoga é uma filosofia para a vida. Sua proposta é universal e acessível a todos que queiram se dedicar a esse caminho com sinceridade, sendo esta pessoa um asceta ou um membro ativo da sociedade ( assim como a maioria de nós). 

 

As raízes da tradição do Yoga, por estarem escondidas em um passado muito distante, acabaram sendo explicadas através de lendas e mitos. Essas lendas variam um pouco dependendo da linhagem devocional. Os textos Haṭhayoga pradipika e Shiva Sanguita afirmam que as práticas de Yoga teriam surgido do Deus Shiva, a quem se atribui ter sido o primeiro dentre os Yogis ( a relação de Shiva e o Yoga antecede sua posição na trindade hindu, onde Brhama é o criador, Vishnu o mantenedor e Shiva o renovador, e refere-se à imagem do Yogi asceta envolto em meditação nas montanhas do Himalaia milhares de anos antes do surgimento do hinduísmo que conhecemos hoje). Essa versão é a mais popular, mas não é a única. No texto Yoga Yajnavalkya samguita, o sábio Yajnavalkya alega que o Yoga surgiu de Brahma na forma de Hiranyagarbha. Nos puranas o Deus Narayana também é reverenciado como o criador do Yoga. No Baghadva Gita, Krishna é reverenciado como sendo o senhor do Yoga.

 

Estudiosos indianos apontam a “era da floresta” (12.000-10.000 a.C.) como a época em que os primeiros seres iniciaram suas práticas introspectivas na busca por entender o significado da vida e as maneiras harmoniosas de se viver, e se relacionar com o todo à sua volta. Esses questionamentos fizeram daqueles seres os primeiros sábios da antiguidade e culminou no surgimento da cultura Védica. 

 

A ancestralidade da cultura Védica é evidente e, desde sua origem, incentiva a busca pelo autoconhecimento. A devoção (Bhakti) e o cumprimento do dever pessoal (Dharma) eram os principais valores cultivados para a realização espiritual. O processo de auto investigação que possibilitava o controle das tendências mentais e a comunhão do sujeito com sua própria essência, era conhecido como Yoga. Embora o Yoga hoje seja conhecido, muitas vezes, como uma atividade física, na índia antiga o Yoga era considerado a ciência que investiga a mente. Acredita-se que o Yoga esteve presente na construção dessa cultura desde o período da “era da floresta”. 

 

Na literatura Védica o Yoga é quase sempre relacionado a práticas ascéticas de autodisciplina (tapas) e poderes místicos (siddhis), mas enxergar o Yoga apenas por esse prisma é algo limitante. 

 

O conhecimento milenar referente ao Yoga foi sintetizado e sistematizado por Patañjali na obra intitulada Yogasūtra, elaborada provavelmente entre os séculos III e II a.C.. Além de dissecar os processos mentais, explicando seus diferentes níveis, condicionamentos, tendências e eventuais processos de transformações, o Yogasūtra apresenta vias práticas para que o indivíduo consiga alcançar este estado elevado de consciência e emancipar-se de tudo aquilo que prejudica sua comunhão com sua essência espiritual. O que o levaria a constatação do divino em si mesmo. 

 

O interesse pelos ensinamentos contidos no Yogasūtra vem crescendo significativamente. Isso é um sinal de que os praticantes estão buscando um mergulho mais profundo e de que o Yoga é realmente uma filosofia universal e atemporal.

 

 

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