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Sobre os Vedas  -  questionamentos e evidências de uma tradição milenar

 

 

A autenticidade dos Vedas, durante um período da história, chegou a ser questionada. Em 1805, o alemão Friedrich Shlegel, novelista e homem do estado, apresentou sua teoria em que afirmava haver uma grande similaridade entre o sânscrito, o persa, o grego, o celta, a língua germânica e a eslava. Esse estudo sugeria que todas elas tivessem a mesma matriz, também gerou grande especulação. A partir daí, nasceu a teoria de que a Índia teria sido invadida por um povo estrangeiro que trouxe consigo essas raízes linguísticas e que teria migrado de algum lugar da Ásia Central por volta de 1.500 A.C.. Posteriormente, em 1819, Shlegel usou o termo Aryano para classificar esta raça que além da Índia também teria migrado para diferentes partes do globo. Na Índia, os Aryanos teriam chegado pelo noroeste, se estabelecendo inicialmente onde hoje é o estado de Punjabi e ocupando, posteriormente, a planície do Ganges. Assim, a cultura védica teria sido trazida com esse povo ou nascido da fusão entre o povo invasor e o nativo.

 

Essa versão acabou sendo aceita pela maioria dos historiadores europeus. Mas devido à falta de evidências concretas, nunca existiu um consenso em relação ao local de origem desse povo Aryano. Historiadores divergiram entre Anatólia (parte central da Turquia), Irã, Europa (criando o termo indo-europeu) e até mesmo Atlântida, mas nunca nenhuma teoria foi convincente o suficiente para ser tomada como verdade. 

 

A resposta para esse questionamento sempre foi um grande mistério. Isso porque a Índia sofreu grandes invasões e é possível datar e identificar a origem de todos os povos que para lá migraram. A única dúvida persistente é em relação a terra de origem dos Aryanos. No sec. 5 A.C. o império Aquemênida invadiu o leste do Afeganistão e quase todo Paquistão, estabelecendo o império Persa até a próxima invasão em 334 A.C. quando Alexandre estendeu seu império até o estado indiano de Punjabi. A partir do sec. 8 árabes omíadas foram gradativamente chegando à Índia e introduzindo a cultura islâmica. Em 1526 Badur, de origem turco-persa-mongol, estabeleceu o império Mogol, até finalmente o império Britânico assumir o controle da Índia a partir de 1858.

 

A Inglaterra, então colonizadora, e os padres missionários, foram os grandes propagadores da teoria Aryana. A Índia, que até então não tinha dúvida alguma sobre suas origens e autenticidade de sua cultura, viu sua rica e milenar história ser manipulada. Isso provavelmente aconteceu como uma manobra política dos colonizadores. 

Essa teoria conseguiu desunificar racialmente os Indianos. Ao norte, identificaram-se os Aryanos, de pele mais clara, que teriam expulsado e pressionado os nativos, Dravidianos, de pele mais escura, para o sul. Além de criar idéias separatistas, essa teoria também questionava a grandeza da cultura Védica, pois a tornava estrangeira e, segundo os padres jesuítas, efêmera e imposta covardemente aos inocentes e legítimos nativos da Índia. Essa idéia foi massivamente difundida. Os livros escolares de história foram modificados e devido a essa forte imposição, com o passar dos tempos, ela inevitavelmente acabou sendo aceita pela maioria dos indianos.

No entanto, para religiosos e eruditos indianos esse questionamento nunca existiu. Se por um lado a teoria de invasão Aryana era suportada pelo estudo de similaridade lingüística de Shlegel e a propaganda de estudiosos europeus e por missionários religiosos, a cultura hindu sempre teve como provar sua autenticidade com evidências literárias, astrológicas e arqueológicas. A importância de esclarecer esse assunto se deve ao fato de muitos livros sobre Yoga ainda trazerem como verdade o injusto mito sobre a invasão Aryana.

 

A literatura Védica não faz menção a essa suposta invasão. Dentro desse contexto literário, Aryano significa literalmente “pessoa nobre”. Ela não é relacionada a uma raça e sim a uma identidade. Aqueles que assumiam certos costumes, valores e códigos de conduta, formavam uma identidade Aryana. O cultivo dessas atitudes teria se difundido pela Índia e seus arredores, e não ao contrário. A Índia (hindustan), nome dado pelos invasores devido ao rio Indus pelo qual chegavam, era antes chamada por seus habitantes de Bharata, devido ao rei Bharat. Posteriormente chamava-se Aryavarta, residência dos Aryanos. Nenhuma outra região fora da Índia é mencionada no Rig Veda, além do Irã, governado por Yama, irmão mais novo de Manu Vaivasvata. Não ha menção de uma terra natal fora da Índia. 

 

Os textos Puranicos mostram uma linhagem sucessiva e inquebrável de reis originada no período do Rig Veda. Manu Vaivasvata teria dado origem à sequência de dinastias que pode ser quase toda rastreada. Por exemplo, Rama, o protagonista do épico Ramaina, foi o sexagésimo-quarto a reinar na dinastia Suryavamsh, fundada por Ikshavaku. Yudhishthira, da dinastia Chandravamshis, foi coroado logo após o fim da guerra narrada no épico Mahabharata e reinou por 36 anos. Essa guerra entre os Pandavas e Kurus coincide com o inicio da era de Kali, que teria começado em 3102 A.C. A astrologia Védica também indica datas muito anteriores a suposta invasão Aryana, que teria ocorrido por volta de 1.500 A.C.. O Yajur e Athara Veda, por exemplo, descrevem um equinócio em Krittikas (plêiades, antigo touro) e um solstício de verão em Magha (antigo leão) referente a 2500 A.C. aproximadamente.

 

Escavações feitas por Sir John Marshall entre 1920 e 1922, trouxeram à tona evidências para o fim dessa discussão. No deserto de Thar, no Paquistão, perto da fronteira com a Índia, foram descobertos grandes centros urbanos. Harapa e Mohenjodaro, construídas às margens do rio Indus e Saraswati, possuíam características peculiares e muito à frente de seu tempo quando comparamos com os Sumérios na Mesopotâmia (3500-2340 A.C.), por exemplo. Elas apresentavam uma grande estrutura social e urbanística com casas com banheiros no segundo pavimento, piscinas comunitárias, sistema de esgoto e irrigação e uma grande produção artística e comercial. Mohenjodaro chegou a ter cinco milhões de habitantes, sendo portanto o lugar mais populoso do mundo em sua época. Vestígios dessas civilizações podem ser apreciados no museu de Nova Delhi na Índia.

 

As características védicas nessas cidades são evidentes. Imagens de seres em postura de meditação, símbolos, vestimentas, objetos e altares de fogo védicos foram encontrados em diversos sítios espalhados pela região descritos exatamente como nas escrituras Védicas. Essas evidências comprovam a ancestralidade dessa tradição assim como sua continuidade até os dias de hoje. Harappa, por exemplo, existiu entre 3100 A.C e 1900 A.C e foi abandonada por sua população que migrou para a planície do Ganges devido à mudança do curso do rio que a abastecia.

 

O Rig Veda faz alusão a esses centros urbanos e dedica vários hinos ao extinto rio Sarasvati (RV II,41.16; VI 61,8-13). Esse rio era o mais volumoso entre os sete principais rios citados no Rig Veda. Estudos feitos no solo, onde existia o rio, revelaram que este secou 400 anos antes da suposta invasão Aryana sugerida no século XIX por estudiosos ocidentais. 

 

Surge então um questionamento muito interessante: por que um povo não colocaria em sua principal obra literária, que são os hinos Védicos, nenhuma evidência de sua terra natal mas, ao mesmo tempo, faz menção e cultua um rio que teria secado séculos antes de sua chegada a Índia? A razão por nunca ter existido um consenso em relação à terra de origem dos Aryanos não é um mistério. Todas as evidências concretas indicam que estes pertenciam justamente à Índia. 

 

Assim eu soube por seus habitantes e assim eu li em seus livros. 

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